Convênio ICMS nº 174/2023 - Regulamentação da transferência de créditos em operações interestaduais entre estabelecimentos do mesmo titular (ADC nº 49/RN)
A Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49, proposta pelo Estado do Rio Grande do Norte, teve seu mérito apreciado pelo Supremo Tribunal Federal em abril de 2021 para declarar a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Complementar nº 87/96 que dispunham sobre a incidência do ICMS nas transferências de bens entre estabelecimentos do mesmo titular.
Como se verifica da ementa do julgado, “a hipótese de incidência do tributo é a operação jurídica praticada por comerciante que acarrete circulação de mercadoria e transmissão de sua titularidade ao consumidor final”. Do mesmo modo, entendeu a Corte que “o deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não configura fato gerador da incidência de ICMS, ainda que se trate de circulação interestadual”. Contudo, tendo em vista o princípio da não-cumulatividade, restou decidido que deveria ser mantido o direito ao crédito referente às operações anteriores.
Em abril deste ano, a Suprema Corte acolheu os Embargos de Declaração opostos pelo Estado do Rio Grande do Norte para modular os efeitos da decisão, que terá eficácia a partir de janeiro de 2024, prazo no qual os Estados devem regulamentar a matéria atinente à transferência dos créditos, assegurando-se aos contribuintes, caso os Estados não disciplinem a matéria dentro desse prazo, o direito de transferência dos créditos.
Por ocasião do julgamento da ADC nº 49 pelo STF, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) publicou o Convênio ICMS nº 174/2023, em 1º de novembro de 2023, para regulamentar a transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, trazendo as diretrizes para o repasse dos créditos de ICMS.
Segundo disposição do Convênio, é obrigatória a transferência de crédito do ICMS do estabelecimento de origem para o estabelecimento de destino na remessa interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade. Tal transferência deve ser operacionalizada por meio de:
1. Destaque de ICMS na Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) que acobertar a remessa da mercadoria do estabelecimento remetente ao estabelecimento destinatário;
2. Lançamento do valor do ICMS a débito na escrituração fiscal (livro de Saídas) do estabelecimento remetente; e
3. Lançamento do valor do ICMS a crédito na escrituração fiscal (Livro de Entradas) do estabelecimento destinatário.
A apropriação do crédito e a emissão da NF-e seguirá as mesmas regras previstas na legislação tributária do Estado de destino, aplicáveis à apropriação do ICMS incidente sobre operações com estabelecimento pertencente a titular diverso. Na hipótese de haver saldo credor remanescente de ICMS no estabelecimento remetente, este será apropriado pelo contribuinte junto à unidade federada de origem, observando-se o disposto em sua legislação interna.
O Convênio também traz que o ICMS a ser transferido corresponderá ao resultado da aplicação dos percentuais equivalentes às alíquotas interestaduais (art. 155, §2º, inciso IV da Constituição Federal), sobre os valores dos bens e mercadorias, quais sejam: (i) o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria; (ii) o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento; e (iii) tratando-se de mercadorias não industrializadas, a soma dos custos de sua produção, assim entendidos os gastos com insumos, mão-de-obra e acondicionamento; e, em todas as hipóteses, o valor do ICMS calculado a ser transferido deve ser incluído na base de cálculo.
Por fim, há expressa previsão no sentido de que a adoção da sistemática de transferência de créditos não importa no cancelamento ou modificação dos benefícios fiscais de ICMS usufruídos pelo estabelecimento remetente, no Estado de origem.
Com a publicação do Convênio, a partir de 1º de janeiro de 2024, os contribuintes deverão observar as novas regras referentes às operações interestaduais de transferência.
Ressalte-se que, no âmbito do Poder Legislativo, está em andamento o Projeto de Lei Complementar nº 116/2023, de relatoria do Senador Fernando Bezerra Coelho, que contém as seguintes propostas de alteração da Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir):
• Não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento para outro da mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais em que os créditos estão assegurados. Nesse caso, a transferência fica limitada aos percentuais estabelecidos nos termos do incido IV, do §2º do art. 155 da Constituição Federal, aplicados sobre o valor atribuído a operação;
• Alternativamente, por opção do contribuinte, a transferência de mercadoria para estabelecimento pertencente ao mesmo titular poderá ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto, hipótese em que serão observados: (i) nas operações internas, as alíquotas estabelecidas na legislação e (ii) nas operações interestaduais, as alíquotas fixadas nos termos do inciso IV, §2º do art. 155 da Constituição Federal;
• Revogação do art. 13, §4º da LC 87/96, declarado inconstitucional pelo STF, pelo art. 2º do PLP 116/23.
Entre as diversas implicações decorrentes da publicação do Convênio ICMS nº 174/2023, tem-se que o Convênio disciplinou matéria de competência exclusiva de lei complementar, o que afronta o artigo 146, inciso III, da Constituição Federal, e, ainda, como cediço, os Estados deverão editar suas normas estaduais no intuito de internalizar as disposições do Convênio, além de também termos que aguardar a aprovação ou não do Projeto de Lei mencionado para se ter uma maior definição do correto procedimento para o aproveitamento desses créditos, bem como, o Convênio em nada abordou questão relativa a mercadorias sujeitas ao ICMS-ST nas operações interestaduais de transferência.
A equipe tributária permanece acompanhando os possíveis desdobramentos do tema.