TRIBUTÁRIO
Receita Federal publica novas Soluções de Consulta e restringe a exclusão das subvenções da base de cálculo do IRPJ e CSLL
Por: Mateus Filipe e Ana Eliza Jácome
As subvenções governamentais (crédito presumido, redução de base de cálculo, isenção etc.), passaram a ter grande relevância no cenário jurídico, na medida em que se era discutido se a subvenção era do tipo de investimento ou de custeio, assim como do cumprimento de certos requisitos na legislação, para fins de tributação pelo IRPJ e a CSLL.
Nesse sentido, convém rememorar que a tributação federal das subvenções, inicialmente, era disciplinada no art. 30 da Lei nº 12.973/2014, segundo a qual exigia-se o registro em reserva de lucros (Reserva de Incentivos Fiscais) e que não tivessem outra destinação, para que não fossem computadas na apuração do lucro real e, por sua vez, submetidas à tributação.
Posteriormente, sobreveio a Lei Complementar nº 160/2017, que passou a disciplinar a concessão de benefícios fiscais no âmbito dos Estados, assim como promoveu as seguintes modificações no tocante às subvenções:
- Inclusão dos §§4º e 5º na Lei nº 12.973/2014 e, consequentemente, dispôs expressamente que os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiros fiscais relativos ao ICMS serão considerados como subvenção para investimentos;
- Estabeleceu, no art. 10, que as novas disposições da Lei nº 12.973/2014, se aplicariam, inclusive, aos benefícios fiscais instituídos pelos Estados antes da publicação da Lei Complementar em questão, desde que fossem atendidos os requisitos de Registro e Depósito destes na Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ).
Neste contexto, no ano de 2018, o STJ analisou a tributação do crédito presumido de ICMS, por meio do ERESP nº 1.517.492/PR, em que estabeleceu que a tributação dos créditos presumidos do ICMS pelo IRPJ e CSLL, ofende o pacto federativo e a política de incentivo adotada pelo Estado membro, já que esvazia a concessão do benefício e sua finalidade, dispensando o Contribuinte, ainda, da necessidade de registro em Reserva de Lucros/Incentivos Fiscais.
Contudo, apesar do julgado do STJ e da entrada em vigor da Lei Complementar nº 160/2017, a questão da tributação das subvenções não foi pacificada, na medida em que a Receita Federal continuou afirmando, por meio de Soluções de Consulta, que o Contribuinte deveria provar que o benefício foi concedido para construir ou expandir o estabelecimento industrial, como consta na Solução de Consulta COSIT nº 145/2020.
Por sua vez, em 2023, a discussão da tributação dos incentivos fiscais de ICMS retornou novamente ao STJ, por meio do Tema Repetitivo nº 1.182. Nesse caso, diferente do crédito
presumido, a Corte Superior apreciou se seria possível excluir os benefícios fiscais do ICMS (redução de base, alíquota, isenção, diferimento, dentre outros), da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Desse modo, a Corte entendeu que os demais benefícios somente poderiam ser excluídos da tributação, se atendidos aos requisitos previstos na Lei nº 12.973/2014 e art. 10 da Lei Complementar n. 160/2017, não cabendo a demonstração de concessão do benefício como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, como sustentava a Receita Federal em Soluções de Consulta.
Em outras palavras, para esta situação, o STJ reconheceu que a exclusão da base de cálculo do IRPJ/CSLL era aplicável a todos os benefícios de ICMS (não só o crédito presumido), mas exigiu a prova de que o valor foi destinado à Reserva de Incentivos Fiscais, ou seja, confirmando a necessidade de cumprir o art. 30 da Lei 12.973/2014.
Por sua vez, ao final do ano de 2023, isto é, após o julgamento do STJ, houve a edição da Lei nº 14.789/2023, que alterou completamente o tratamento tributário das subvenções, passando a prever, em resumo, as seguintes alterações:
- Revogação do art. 30 da Lei nº 12.973/2014 e, consequentemente, a tributação imediata de todas as receitas decorrentes das subvenções, pouco importando a natureza, pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS;
- Criação do crédito fiscal de IRPJ correspondente à alíquota de 25%, desde que cumpridos novos requisitos e habilitação prévia junto à Receita Federal do Brasil, que poderia ser utilizado em compensações com tributos federais ou pedido de ressarcimento.
Neste “novo” cenário, portanto, a Receita Federal trouxe estruturas mais hígidas na tributação dos benefícios fiscais, impedindo que ocorressem a exclusão destes da base de cálculo dos tributos federais, incluindo os créditos presumidos.
Tal ponto é confirmado, já que a Receita Federal publicou, recentemente, as Soluções de Consulta COSIT nºs 202, 216, 223, 224 e DISIT/SRRF04 nº 4061, em que pode se dizer em completo desacordo com o entendimento do STJ no ERESP nº 1.517.492/PR e no Tema Repetitivo nº 1.182, sob os seguintes argumentos:
- Na visão interpretativa da RFB, com a edição da Lei nº 14.789/2023, todas as modalidades de benefícios seriam tributadas, independentemente de serem subvenções para custeio ou investimento;
- Exigência de acréscimo patrimonial, ou seja, necessidade de que haja acréscimo patrimonial, para todos os demais benefícios, para que haja a exclusão dos benefícios da base de cálculo dos tributos federais, em períodos anteriores a 2024;
- O tratamento tributário das subvenções se dá exclusivamente por meio da Lei nº 14.789/2023; e
- Os fatos geradores ocorridos a partir de 01º de janeiro de 2024, já não é autorizada a exclusão da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, incluindo o crédito presumido.
A grande questão é que este cenário, pode se dizer, tem a capacidade de instaurar um novo capítulo no contencioso, já que, principalmente, em relação ao crédito presumido do ICMS, a jurisprudência do STJ foi clara ao extrair os fundamentos da Constituição Federal, e não com base no artigo 30 da Lei nº 12.973/2014, que foi revogado pela Lei nº 14.789/2023, havendo uma clara ingerência da Receita Federal em não acatar a tese firmada.
Além do mais, a exigência do acréscimo patrimonial manifestada nas Soluções de Consulta em relação aos demais benefícios de ICMS, contraria o precedente do STJ, firmado no Tema Repetitivo 1.182, já que não foi estabelecido pela Corte Superior a necessidade de comprovar o acréscimo patrimonial, mas pelo contrário, foi sedimentado que não caberia essa demonstração pelas empresas, apenas que o valor foi destinado à Reserva de Incentivos Fiscais e não fosse distribuído aos sócios ou acionistas.
Desde já, informamos que nossa equipe Tributária está acompanhando os desdobramentos do tema e se encontra à disposição para mais esclarecimentos.
